segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

O camarão-tigre, em Mocambique


O camarão-tigre,

No post anterior que eu falava sobre Moçambique, mencionei que na sequência eu iria tentar falar um pouco sobre os aspectos da identidade do moçambicano. No entanto, por se tratar de tema complexo e ainda por não ter ouvido todas as fontes que gostaria, preferi postar um antes que fala também dessa identidade, mas sobre outra vertente. Espero que goste. Vamos a ele.
Comer frutos do mar em Moçambique não é considerado um luxo como em muitas partes do Brasil. Em Minas, por exemplo, principalmente em Belo Horizonte, vejo “restaurantes legais” colocar os preços dos mariscos nas alturas, só para nos fazer lembrar nossa distância do Atlântico. (risos)
Os amigos mais próximos, família e Luisa conhecem bem o meu “subnutrido apetite” por tudo que debaixo d’água vive. Tenho uma certa resistência herdada do ventre materno (risos). Mas creia, isso não me impediu de comer um camarão pescado em Moçambique. “O camarão-tigre”. Um orgulho nacional, pelo que percebi.
É recorrente a afirmação entre os moçambicanos que converso de que “o camarão pescado na costa de seu país é o melhor do mundo”. Não tenho parâmetros para falar sobre, dada a minha forte aversão a crustáceos (que continua, diga-se de passagem – mesmo diante de sucessivas tentativas), mas há quem diga “que é realmente sensacional”…
Degustei o tal e de quebra, conheci um local muito bacana. Não sei ao certo se gostei mais do camarão ou do lugar encontrado. Mas de qualquer forma, entre dúvidas e certezas, cá está esse post que divido com você agora.
Onde encontrar o tal tigre
Bom, já falei bastante e ainda não disse onde comer esse camarão né? Você pode encontrá-lo fresquinho, saído das águas mansas do Índico no Mercado do Peixe, em Maputo. Ainda continuo sem saber se gostei mais do “tigre” ou do lugar onde o comi, mas chega de enrolação, vamos lá.
Mercado do Peixe em Maputo
O local é superagradável e é uma parada obrigatória para a “turistada”. De fácil acesso, tanto de carro como de “chapas” (tranporte coletivo de Maputo), o Mercado está localizado na Avenida Marginal, próximo a praia da Costa do Sol, agarradinho ao Clube Marítimo e é, sem dúvida, um dos locais que você não pode deixar de visitar na capital de Moçambique.
Uma dica. Se você for do tipo  “nojentinho (a)”, conhecer o “Mercadão” pode não ser aprazível. Se é daqueles (as)  “tudo clean com glamur e fru-frus”, passar por esse sítio (local, como dizem por aqui) pode ser um programa desastroso. Por quê? Explico: o cheiro forte dos peixes e a aglomeração de gente podem incomodar alguns mais sensíveis aos cheiros e a “poeira de gente”.
Conselho. Se você é assim esqueça esse post e vá ler em outro lugar algo sobre “como eliminar germes” ou ainda “como se deliciar da alta culinária sem sujar suas mãos e dentes” (risos). Lencinhos umedecidos e tchau-tchau. Foi mal, mas detesto “gente limpinha demais. Pago por minha sinceridade.
Espantados os “frescóides de plantão”, tenho a dizer que o lugar não é tão bonitinho à primeira vista. Mas, se você ainda quiser conhecer e tiver um olhar mais atento vai perceber que lá é um lugar de efervescência de costumes locais, de cores, de sons e de cheiros que vale à pena conferir. E claro, comer o legítimo camarão moçambicano pode valer às custas de se aventurar por lá. Porque lá é realmente uma aventura, explico a seguir.
O que se vê do lado de fora
Não se assuste. Na rua do mercado há um transa-transa de gente comprando e vendendo coisas. Vão lhe oferecer algo com certeza. Nas barraquinhas do lado de fora do Mercado você encontra de tudo: preservativos, ervas medicinais, vassouras, bolsas femininas, papel higiênico, alicates de unha, artigos eletrônicos, foguetes, velas, detergentes, chocolates, cigarros e bebidas. Um mercado paralelo ao  Mercado do Peixe que é curioso observar. Mas o melhor ainda está por vir.
Já à porta, muitas atendentes dos restaurantes que ficam ao fundo do Mercado do Peixe vão te abordar querendo levá-lo (a) aos seus respectivos estabelecimentos. Elas são realmente determinadas. Então, dê seu jeito e vá primeiro dar uma voltinha nas barracas dentro do Mercado antes de pensar em se sentar para o almoço. Despistá-las é a saída. Mas adianto, não é tarefa das mais fáceis.
As barraquinhas de madeira
Extensas bancadas de madeira se misturam a peixes coloridos, balanças e gente passando de um lado para o outro. Paredes desgastadas pelo tempo nem se percebe, o charme fica por conta dos incansáveis vendedores que comercializam variados tipos de peixe, ostras, camarões-tigres, lagostas, lulas e caranguejos.
Perguntei a uma “mamá” (maneira respeitosa como os moçambicanos tratam senhoras de idade em changana) se o Mercado abre todos os dias e ela com as mãos perfumadas por uma lula me respondeu que sim. Até aos domingos “mamá”? “Sim, “boss”, é nos domingos que vem mais “gentes” parar neste sítio”. (sic)
O que é o mais legal? O legal é você ir até lá e “pescar” seu peixe numa das barraquinhas de madeira do mercado. Outra coisa bacana é poder levar para o preparo num dos restaurantes que ficam no fundo do lugar. Mas há também alguns inconvenientes, conto na sequência.
Se esquive dos vendedores chatos
Os “papás” e “mamás” vendem freneticamente seus pescados. E são super insistentes no comércio dos mariscos. Não se engane, são tão chatos que se você não estiver numa “vibe legal” vão conseguir lhe estressar. É a prática do local fisgar o cliente pela boca, ops, insistência. Não tenha medo de ser duro (a) em alguns momentos, pois caso contrário, vai chegar um momento em que 15 ou 20 vendedores vão fazer sua cabeça fritar mais que peixe na frigideira. Paciência e firmeza não faz mal a ninguém.
Eles chegam mesmo a brigar um vendedor com o outro por conta de uma venda. Disputam clientes no anzol. E quando pescam seus clientes, aí é a hora de negociar. A parte mais legal.
Se você estiver disposto a degustar o “camarão-tigre” é preciso pechinchar. O barato é isso, a negociação dos pescados pode durar horas e nesse meio tempo você pode ir sentindo o local e perceber os hábitos e práticas do lugar.
Se estiver com pressa, esqueça. O lance é passar pelas barraquinhas de madeira, apressar os valores dos peixes e conversar com os vendedores. Ah e “gringuitos” no final sempre irão gastar um pouquinho a mais. É normal isso por aqui, uma prática corriqueira. Para além do produto que escolheu, saiba tirar dali outras experiências.
Saiba que tudo lá é muito fresquinho, apesar de não haver refrigeração. O pescado fica no gelo e não tem aquele odor de peixe velho não! No entanto, se você não saca muito de frutos do mar, o mais recomendável é ter um amigo que faça às vezes. Pois, apesar de ser tudo muito fresco, um ou outro pescado pode estar digamos: “em processo de amadurecimento”. (risos)
Média dos preços
Vamos lá, se me recordo bem era assim: 1kg de camarão-tigre = 550,00 meticais (mtc); 1kg de camarão kapa = 450,00 meticais (mtc); 1 kg de lagosta = 600,00 meticais (mtc) e 1 kg de lula = 350,00 meticais (mtc). Claro que há também uma variedade gigantesca de outros pescados. E tudo é negociável. Para se ter uma ideia em reais, divida tudo por 14 e vai saber. E esse valores podem cair bastante, basta exercitar a arte que sabemos bem: “dar uma choradinha nos preços”. Outra coisa importante é checar a balança na hora de comprar os pescados e ficar esperto para não ser enganado (a).
Restaurantes do Mercado
Depois que você escolheu tudo fresquinho é hora de levar o que comprou para os restaurantes que ficam lá no fundo do Mercado do Peixe. Há vários e você pode escolher. Lá eles limpam o peixe e preparam tudo. Servem acompanhamentos e uma cervejinha não muito gelada. Whatever, estamos em África meus caros brasileiros. Cerveja gelada é coisa rara por aqui. Ah, outra coisa: seu prato com o pescado vai demorar um bocadinho (risos). Esteja disposto (a).
Atrás das barraquinhas onde os vendedores se digladiam pelos clientes, você encontra um lugarzinho bem aconchegante, com várias mesas de plástico e cadeiras ao redor de um “canheiro” (árvore que da o fruto marula – lembra aquela bebida “Amarula” que a gente toma no Brasil? Pois é, a própria), que faz sombra ao local e deixa extremamente convidativo sentar-se ali e aos seus pés.
Vai demorar o prato? Vai, mas vale à pena deixar-se embalar pela sombra daquela árvore e ali, abraçado por ela, tomar uma 2M (cerveja local) e prosear com os amigos ao som de muitas músicas tradicionais que tocam nos restaurantes dali. Isso só abre o apetite e o preço é acessível.
Almoçar lá é “maningue nice” (maneira usual do moçambicano se referir a algo muito bom – maningue em changana quer dizer muito e nice – pô, claro que você sabe o que isso significa em inglês). E vale à pena viu, até para quem não curte peixe como eu.

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